Revista de Imprensa

 

Saber ler as regras. Um caso real

José Dias Pereira – CT do Clube de Golfe do Estoril

 

À primeira vista parece que os jogos vão sendo cada vez mais complicados consoante aumenta a superfície onde se desenrolam, independentemente do seu grau de dificuldade pois este é sempre grande quando se pretende atingir um nível qualitativamente elevado. O xadrez ou as damas terão “meia dúzia” de regras, já o futebol, jogado num grande rectângulo, obedece a maior número delas. Imagine-se o que é jogar em 50 ha ao ar livre: 33 Regras e largas centenas de Decisões. 

É DE FACTO COMPLICADO! 

Mas … se no Jogo sempre cumpríssemos com os seus três mandamentos fundamentais: Jogue a bola tal como está, jogue o campo tal como o encontra, e se não o puder fazer faça o que for “fair”, precisando para tal de conhecer as Regras 

TUDO SERIA MAIS FÁCIL. 

E este mais fácil assenta essencialmente nos seguintes vectores: análise da situação, bom senso e, sobretudo, “fair play” alicerçados no conhecimento das Regras. 

Este intróito para opinarmos sobre uma situação real de jogo de que tivemos conhecimento e que foi, quanto a nós, correctamente gerida pelo integrante da Comissão Técnica (CT) do Clube onde tal sucedeu. 

Passamos a descrever: 

Numa competição por buracos, o jogador A informou o jogador B de que o seu handicap de jogo era 10 e ganhou o jogo. Mais tarde verificou-se que afinal a informação estava errada. O handicap de jogo era 9. 

No futebol quando um defesa está sobre a linha de baliza e a bola não entra porque bate num dos seus braços todos nós gritamos “penalty”. No golfe há que estudar o assunto com prudência. E foi o que fez o elemento da CT que decidiu, e bem, desclassificar o jogador A por aplicação da R6-2 a) que diz: 

…se um jogador começar a partida tendo declarado um abono mais elevado do que aquele que lhe corresponde e isso afectar o número de pancadas dadas e recebidas, é desclassificado  

Contudo, não o desclassificou imediatamente. É que a quase totalidade das regras têm Decisões que clarificam assuntos que de outra forma poderiam ser ambíguos. Há que ver se eventualmente alguma delas poderia ser aplicável.

A Decisão 6-2 a/5 poderia, para espíritos menos avisados e pouco conhecedores da Regulamentação geral do Golfe, estabelecer a confusão. 

“D 6-2 a/5 – Q – In a handicap match between A and B, A stated by mistake before the match began that his handicap was ten strokes, whereas in fact his handicap was nine strokes. The match was played on the basis that A’s handicap was ten stokes. A won the Match. The error was discovered after the result had been officially announced. What is the ruling?

A – The match stands as played. No claim by B could be considered unless A had known he was giving wrong information about his handicap – Se Rules 2-5, 6-a and 34-1a.” 

Mas esta Decisão não tem aplicabilidade.   

De facto A tem de conhecer o handicap pois é responsável pela sua actualização permanente (Sistema de Handicap EGA). Acresce que no caso vertente esse handicap não era alterado há meses e sempre constou de lista publicitada pelo Clube em lugar público e no “site” da FPG. O não conhecimento ou esquecimento por parte de A não poderia nunca ser arguido. 

Perguntar-se-à qual a razão de ser desta Decisão. Independentemente de ter de abarcar diversos Sistemas de handicaps, no nosso Sistema EGA cobrirá alterações administrativas de handicaps, como a revisão anual ou decisão da CT, situações em que o novo handicap só entra em vigor após comunicação ao interessado. Não era o caso obviamente. 

Este caso ilustra perfeitamente vários aspectos que consideramos deverem merecer a atenção de quantos estão ligados ao golfe. 

Um primeiro refere-se ao “fair play” de que se reveste a actuação dos jogadores. Quando se dá ou se beneficia duma informação/situação errada que é susceptível de ter influência no resultado só há uma atitude a tomar: a auto desclassificação. Esta a atitude que deveria ter sido tomada pelo jogador A. 

Há que banir do golfe a cultura futebolística de que as faltas são aceitáveis desde que o árbitro as não sancione. Ao contrário de outras modalidades o golfe proporciona nas suas regras as soluções que os jogadores precisam para resolver os erros que voluntária ou involuntariamente cometem. 

Também assaz importante é a actuação das CT. A CT num Clube é uma das comissões chave pois do seu bom funcionamento depende muito do prazer do golfe e até do sucesso do Clube. Elaboração do calendário de provas, elaboração de regulamentos, preparação do campo, estabelecimento de regras locais, supervisão das competições, informações atempadas, são funções basilares duma CT. Para serem cabalmente desempenhadas obrigam a um conhecimento grande das Regras e regulamentos, sistema de handicaps, grande dose de bom senso, firmeza nas decisões, e até alguma paciência para lidar com uma grande diversidade de interesses dos jogadores. 

Está a FPG a exigir que as CT tenham formação adequada no sistema de handicaps, medida que desde sempre preconizamos e que aplaudimos.

Mas queremos mais.

As CT têm de possuir mais formação noutros campos e acompanhamento sistemático com objectivos eminentemente pedagógicos. Isto porque muitas vezes ninguém melhor do que a própria CT poderá ajuizar de aspectos algo subjectivos de que se revestem as Regras. Repare-se no exemplo que apresentamos. Só a própria CT saberia se haveria qualquer razão administrativa que permitisse a aplicabilidade da Decisão. 

Resumindo:

  • Os jogadores têm de saber ler as Regras e, mais ainda, têm de agir dentro dos valores que constituem a sua envolvente principal, o “fair play”.

  • As CT têm de possuir conhecimentos suficientes, reconhecidos pela FPG, para poder decidir em 1ª instância sobre assuntos deste jaez.

  • É fundamental a formação e acompanhamento das CT, por parte da FPG, pois a acção das CT não é a de mero operador do programa de handicaps Datagolf mas a de garante do correcto desenvolvimento do Jogo nos Clubes. 

Para terminar, e apenas por mera curiosidade, por razões que desconhecemos e que nunca entenderíamos, este assunto, mesmo depois de correctamente resolvido, foi levado a instâncias superiores nacionais e internacionais. A resposta unânime foi a de que o jogador A está bem desclassificado. Quem tomou a decisão estava certo… pois SABE LER REGRAS.

Junho 2006

 


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Revised: 14-08-2006 .